A oração não atendida de Jesus e a patotização do cristianismo
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Por Maurício Zágari
Blog Apenas
Devido à publicação dos dois
últimos livros que escrevi, tenho recebido convites de diferentes igrejas para
pregar, em especial, sobre os temas dessas duas obras. Assim, apenas no último
ano, tive a oportunidade de visitar, conviver, observar e conversar com
líderes e membros de muitas igrejas de diferentes denominações e linhas
doutrinárias, como Batista, Presbiteriana, Anglicana, Assembleia de Deus, Nova
Vida, pentecostais independentes, históricas independentes, Metodista e
Episcopal, além de ministérios interdenominacionais. Essas experiências me
permitiram conhecer de perto realidades eclesiásticas riquíssimas e diferentes.
E, quanto mais eu conheço a família de Cristo, mas me entristece ver aquilo que
passei a chamar de "patotização" do cristianismo.
Confesso que conhecer de perto
essa pluralidade de expressões da fé cristã me encanta. É bonito ver como somos
capazes de adorar o nosso Pai tanto com um conjunto vocal à capela e um órgão
quanto com bateria e guitarras distorcidas. É lindo ver como pregadores de
terno e gravata, colarinho clerical, blaser, camisa social ou camisa pólo são
capazes de pregar, com o mesmo amor e respeito, o evangelho autêntico, a
despeito do tipo de pano que usam sobre o corpo. É extraordinário perceber como
grupos de irmãos mais silenciosos ou mais extrovertidos são capazes de cultuar
a Deus com a mesma sinceridade de coração. É especial notar como cristãos
salvos da linha pentecostal ou cristãos salvos da linha tradicional são filhos
do mesmo Deus e são capazes de se relacionar com ele com o mesmo nível de amor
e devoção. Em resumo, quanto mais eu conheço igrejas diferentes, mais claro
fica que as nossas diferenças são pequenas em comparação às nossas semelhanças.
Tenho aprendido a amar cada vez
mais a noiva de Cristo, apresente-se ela morena, ruiva ou loira. Venho
percebendo cada vez mais a beleza da noiva do Cordeiro, não importa se, como
presbiteriana, ela tenha olhos azuis; como pentecostal, olhos verdes; como
batista, olhos castanhos; e como anglicana, olhos negros. Esses detalhes não
mudam o fato de quem ela é: aquela por quem Cristo subiu à cruz. E, se Deus a
chamou para si, ai de mim desqualificá-la pela cor dos olhos.
Quando você ama alguém, não
importa se ela está de maquiagem ou com cara de quem acabou de acordar. Muito
menos, com roupas caras ou baratas. O amor verdadeiro cuida do ser amado mesmo
quando ele está doente, vomitando e com mau hálito. O amor profundo releva
pequenos defeitos ou atitudes ligeiramente equivocadas que o ser amado
adota com sinceridade. Se você ama de fato alguém, vai botar o foco na
essência, no todo que conquistou seu amor e não naqueles pequenos defeitos que
o ser imperfeito que você ama tem (e quem não os tem, não é mesmo?). Do mesmo
modo, seria bizarro acreditar que Deus rejeite essa ou aquela igreja ou
denominação porque ela de bom coração cometa um ou outro erro - desde que,
claro, não configure heresia.
Infelizmente, o ser humano tem
mania de rejeitar o que Deus não rejeita. Some-se a isso o nosso instinto
gregário, que nos leva a querer andar em bandos e pertencer a tribos com que
nos identificamos, e pronto: tem início a patotização. É natural ao ser humano
e a inúmeras espécies de animais formar patotas. O termo "patota"
significa, simplesmente, "grupo de amigos", "galera".
Porém, no uso popular, essa palavra já ganhou um sentido que remete a uma
panelinha, um grupinho fechado, uma turma de pessoas que se relacionam por
afinidades e rejeitam os que são de fora. Isso é exatamente como se
caracterizam determinados grupos de cristãos. Há pessoas que se agarram tanto
às patotas a que pertencem que, tristemente, se fanatizam, se apaixonam,
recusam-se a ver os defeitos desse grupo, passam a se considerar mais
integrantes dessa turma que aos seus olhos é inerrante do que membros de um
corpo maior - do Corpo maior. De certo modo, praticam a
"patotalatria".
Meu irmão, minha irmã, ser
batista, presbiteriano, metodista, calvinista ou pentecostal não te
define: você é cristão. A superfície do mar não define todo o oceano.
Nenhuma denominação é perfeita. Nenhuma igreja local é irretocável. Nenhum
pastor é inerrante. Nenhuma linha soteriológica merece se tornar sua alcunha.
Se você é mais maranata, presbiteriano ou Assembleia de Deus do que cristão
como todos os outros cristãos, algo está muito errado com a sua fé. Se você é
mais calvinista ou arminiano do que cristão, precisa com urgência voltar às
bases da fé e reaprender o significado de Igreja. Muitos filhos de Deus se agarram
mais à sua patota denominacional ou doutrinária do que ao Corpo maior para o
qual Cristo os chamou. Acham que mudar a visão teológica de seus irmãos em
Cristo para aquilo em que eles acreditam é a sua missão, em vez de se dedicar a
assuntos realmente importantes do evangelho - como evangelização, amor, perdão,
restauração, pacificação, caridade e outros. Querem mudar a teologia alheia,
mas sem levar em conta a graça no trato com o próximo. Acabam se tornando
pregadores de doutrinas e não do evangelho. Apaixonados, muitos se tornam
agressivos, sarcásticos, arrogantes, irritantes, surdos ao diferente, despidos
de bom senso, destituídos de amor cristão. Querem convencer, querem ter razão,
querem converter irmãos do cristianismo para o cristianismo.
Uma fruta não se define pela
casca. Lamentavelmente, muitos cristãos têm se definido por cascas. "Eu
sou reformado", "Eu sou da missão integral", "Eu sou
pentecostal", "Eu sou de Paulo", "Eu sou de Apolo".
Paremos com isso. Paremos com essa atitude separatista e busquemos a
conciliação pelas semelhanças. Nós somos cristãos. Somos de Cristo. Servos do
Deus altíssimo. Filhos do Criador de céus e terra. Cidadãos do reino. Isso,
sim, nos caracteriza. O resto são aspectos periféricos da fé e não devemos nos
separar e fragmentar por causa de diferenças secundárias ou terciárias.
Tenho visto a noiva do Cordeiro
nas diferentes igrejas em que prego, das mais variadas linhas e denominações.
Pessoas que amam o mesmo Cristo que eu e que amam o próximo como a si mesmo com
o mesmo amor. Uns batizam crianças, outros não; uns são cessacionistas, outros
não, uns entendem a eleição divina de um jeito, outras de outro. Mas todas
creem no mesmo Jesus, confessam o credo apostólico, oram ao mesmo Senhor
Soberano, nasceram da água e do Espírito. São meus irmãos em Cristo. São filhos
de Deus. São salvos. Justificados, regenerados, adotados. Vão morar no céu. Meu
papel não é dedicar minha vida a mudar a teologia deles, é viver o amor de Deus
ao lado deles - apesar das diferenças. Triste é quem não percebe isso e investe
seus dias a perder tempo combatendo irmãos que pensam diferente em aspectos
secundários e periféricos da fé, o que não glorifica Deus em nada e tampouco
exalta sua soberania. Deus não precisa de nada disso para ser soberano. Ele é o
que é.
A Bíblia relata que Jesus fez ao
Pai uma oração que nunca foi atendida: "Não rogo somente por estes,
mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a
fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam
eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho
transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu
neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o
mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim"
(Jo 17.20-23). Jesus pediu que nós, cristãos ("aqueles que vierem a crer
em mim"), vivêssemos em unidade, "a fim de que todos sejam um" e
"para que sejam um". Lamentavelmente, nós, cristãos,
estamos longe disso, a unidade que Jesus desejou para nós é um sonho distante,
enquanto, por outro lado, proliferam em nosso meio as obras da carne sobre as
quais Paulo alertou, "discórdias, dissensões, facções" (Gl 5.20).
Meu irmão, minha irmã, como disse
Mário Sergio Cortella, a vida é curta demais para ser pequena. Não desperdice
seus preciosos segundos de vida com aquilo que não é pão. Sinceramente, duvido
muito que Deus esteja preocupado se você é calvinista ou arminiano, pentecostal
ou cessacionista, alto ou baixo, magro ou gordo. Duvido que, ao chegar nos
portões da eternidade, Cristo olhará para você e perguntará que doutrina
soteriológica você professou em vida: o que ele verá é se o sangue do Cordeiro
está aspergido sobre a sua cabeça. Se a sombra da Cruz cobre você. E não creio
que ele dirá algo como "vinde, benditos de meu Pai, porque fostes
reformados ou arminianos, creste no livre-arbítrio ou no TULIP, professastes o
pentecostalismo ou o cessacionismo". O que ele dirá, e disso tenho
absoluta certeza, é: "Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do
reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome,
e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era forasteiro, e me
hospedastes; estava nu, e me vestistes; enfermo, e me visitastes; preso, e
fostes ver-me" (Mt 25.34-36).
Maurício Zágari
Disponível em https://apenas1.wordpress.com/2015/10/13/a-oracao-nao-atendida-de-jesus-e-a-patotizacao-do-cristianismo/
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